terça-feira, 12 de abril de 2016

CALAR EM PAZ - O VALOR DAS PALAVRAS - JORGE WAXEMBERG

CALAR EM PAZ

(O livro pode ser baixado na íntegra acessando: www.cafh.org - idioma português - publicações).

Uma característica bastante comum no temperamento das pessoas e que em muitos casos deteriora as relações é a facilidade com que podem se sentir ressentidas ou ofendidas por causas intranscendentes; em outras palavras, por sua excessiva suscetibilidade.
Todos somos suscetíveis e reagimos quando somos estimulados ou atacados. No entanto, nem todos somos igualmente suscetíveis. Alguns de nós reagimos de forma desmedida e nos mantemos na defensiva apesar de essa atitude nos impedir de ver aspectos nossos sobre os quais podemos ou necessitamos trabalhar.
Sabe-se bem que os que desejam melhorar seu desempenho costumam contratar especialistas para que lhes mostrem o que teriam que corrigir ou mudar no que fazem, porém esquecemos este saber com muita facilidade. Quando nos assinalam uma falta ou uma atitude torpe em nossa conduta, geralmente costumamos responder com justificações ou, talvez, nos irritamos e criticamos a quem talvez deseje nos ajudar com seu comentário ou apontamos os erros de outros como se as falhas alheias pudessem justificar as nossas.
Além disso, quem é muito suscetível não necessita de estímulos concretos para reagir; basta que os imagine.
Por exemplo, quando em uma conversa alguém diz que viu uma pessoa caminhar sem cuidado e arrastando os pés, um dos presentes, muito suscetível, imagina que a pessoa disse isto devido à sua forma de caminhar e começa a dizer o quanto presta atenção quando caminha.
Por outro lado, se somos muito suscetíveis, necessitamos receber o reconhecimento dos demais e damos muita importância ao que dizem ou ao que possam opinar sobre nós.
Por exemplo, em uma reunião alguém comenta, de passagem, que chegou tarde ao trabalho por causa da chuva. Um dos assistentes, muito suscetível, rapidamente diz que nunca chegou tarde a nenhum compromisso, mesmo em caso de mau tempo. Pensa que, com o que disse, irá melhorar sua imagem perante os demais.
Quem é muito suscetível atribui, às vezes, segundas intenções e interpreta comentários sem importância como críticas veladas. Como lhe custa reconhecer sua grande suscetibilidade, ofende-se com facilidade e suas respostas costumam ser agressivas. Tende a ser ácido em seus comentários e crítico em suas apreciações. Sem se dar conta, ao reagir, copia o que o ofende ou se lastima. 
Isto faz com que, se em uma reunião um dos presentes é muito suscetível, com frequência, as conversas não terminem bem ou gerem no ambiente uma tensão que induz os demais a se manterem na defensiva em relação ao que essa pessoa possa dizer.
Devido a uma excessiva susceptibilidade, podemos transformar conversas corriqueiras em críticas pessoais e agressivas. Por exemplo, a uma pergunta inocente, como “Que horas são? ”, em vez de darmos a hora, talvez perguntemos: “Por que está com pressa? ”, “Você acha que estou perdendo tempo? ”. Ou então, à pergunta: “O que você está fazendo? ”, poderíamos responder de forma provocadora: ”Você acha que estou fazendo algo errado? ” “Você sempre acredita que sabe mais do que os demais”.
Como nos libertar da aguda suscetibilidade que entristece a nossa vida e deteriora as nossas relações? Convém ensaiar algum exercício; por exemplo, o seguinte:
  •   Manter-nos alertas quando conversamos. Quando escutamos um comentário que nos faz reagir, não responder de imediato.
  •   Deter nossos lábios e refletir sobre as respostas que se amontoam em nossa mente: O que nos incomoda? O que defendemos?
  •   Por que reagimos? Para quê?
    As reações suscetíveis nos impedem de perceber que há em nós dois conflitos opostos: um com nós mesmos, porque nossa baixa autoestima nos mantém na autocrítica, e outro com os demais, para que reconheçam o nosso valor.
    Demo-nos conta de que nada do que alguém diga sobre nós muda nem o que somos, nem o que podemos e nem o que valemos. Demo-nos conta também que, quando nos defendemos do que nos parece ser um comentário injusto, não aumentaremos o nosso valor nem a estima dos demais. Pelo contrário, é bem possível que nossas respostas deteriorem a imagem que os outros têm de nós. Então que sentido tem começar uma discussão exaltada que sempre vai nos prejudicar? Será que a satisfação que sentiremos ao fazê-la é tão grande que compensará o baixo conceito que outros terão de nós? Não é, por acaso, melhorar esse conceito o que buscamos?
    Se conseguirmos efetuar alguma vez o exercício de conter nossas defesas automáticas, veremos que se tornará cada vez mais fácil fazê-lo. Ao calar e deixar fluir a conversação, o torvelinho mental e emocional de nossa primeira reação se apaga e pouco a pouco descobrimos a alegria de calar a tempo e manter-nos interiormente em paz.
Calar em paz é, então, o exercício que pode nos ajudar a moderar os excessos de nosso temperamento e, especialmente, a gerar paz onde quer que estejamos e naqueles com quem falamos. 

sexta-feira, 18 de março de 2016

DISTÂNCIA DO PASSADO - O VALOR DAS PALAVRAS - JORGE WAXEMBERG

Distância do Passado
( o livro pode ser baixado na íntegra acessando: www.cafh.org - idioma português - publicações ).

Ao deixar de nos fixar no anedótico vão se tornando relevantes as ensinanças contidas nos acontecimentos que vivemos.



O passado que recordamos é um conjunto de vivências que temos de ter muito em conta para não repetir erros e melhorar o curso de nossa vida.
Por outro lado, o passado costuma ser fonte de sofrimentos, remorsos, complexos e travas interiores. O passado se introduz em nosso presente e, às vezes, o encobre de tal maneira que não conseguimos distinguir e avaliar com clareza o que está acontecendo. Além disso, experiências passadas podem nos ocasionar transtornos que necessitam de tratamento especializado.
Mas seja como for o nosso passado, costumamos falar sobre ele –com o passar dos anos vamos olhando menos para frente e mais para trás–. Quando o fazemos, referimo-nos principalmente a acontecimentos, triunfos, fracassos, alegrias, dores e surpresas. Ou seja, narramos fatos. Detemo-nos no que é circunstancial, na serie de impressões que ficaram em nossa memória. Quando essas impressões são fortes ficam muito gravadas não só como fatos mas também como emoções e juízos. Mas isto não significa que tenhamos compreendido as experiências e as mensagens que sempre contêm os acontecimentos que recordamos.
Em relação ao passado, o exercício que propomos tem como objetivo colocar à distância a própria história. Para conseguir essa distância nos exercitamos em não fazer referência a nosso passado.
O hábito de não falar de nosso passado nos ajuda a nos desacostumar de olhar para nós mesmos como ponto de referência de todas as coisas. Ao mesmo tempo, ressalta em nossa mente os aspectos fundamentais desse passado.
Além disso, não falar do passado nos ajuda a tirar o valor subjetivo dos eventos que ocorreram e das consequências ocasionais que eles nos produziram: emoções, reações, decisões, juízos. Em especial, ajuda-nos a não reviver e avivar ressentimentos que possamos ter e necessitamos superar. Ao deixar de nos fixar no anedótico vão se tornando relevantes as ensinanças contidas nos acontecimentos que vivemos.
Por que incluímos este exercício no tema das defesas limitantes?
Porque em muitos casos nos refugiamos no passado para fugir do presente e também para justificar o nosso presente.
Por exemplo, se estamos passando por um momento difícil, em que as coisas que fazemos não estão acontecendo a contento, tendemos a nos consolar recordando-nos –e falando– de nossos êxitos passados. Ou então nos justificamos diante de outras pessoas narrando fatos do passado que tornaram inevitáveis as nossas tribulações –ou as nossas reações– do presente.
Em suma, quando nos refugiamos no passado nos isolamos do presente. Enquanto falamos do que já ocorreu não só nós perdemos o que está acontecendo, mas também o perdem as pessoas que nos escutam, já que reduzimos o seu presente à nossa história sobre um passado alheio a elas.
Como o presente continuamente se transforma em passado, ao hábito de não falar do passado se acrescenta o hábito de não falar sempre do que está nos acontecendo. Isto produz um efeito semelhante ao anterior. Conseguimos ser observadores, dentro do possível imparciais, do que vivemos e também do que está acontecendo conosco. Dessa maneira deixamos de dar tanta importância ao anedotário do momento e podemos começar a descobrir a mensagem e a ensinança que continuamente a vida nos dá.
O exercício de nos distanciarmos do passado é uma extensão do exercício de sair do centro e consiste em:
  • Não falar de nosso passado de forma habitual, a não ser quando for necessário ou conveniente nos referirmos a ele.
  • Deter o hábito –caso o tenhamos– de falar sempre sobre o que está acontecendo conosco.
    O exercício de distanciar-nos de nosso passado nos ajuda, por um lado, a conter as fugas de nossa mente e, por outro, a perceber o que está acontecendo aqui e agora em um contexto maior do que aquele limitado a nossa pessoa. Ajuda-nos, em especial, a estarmos realmente com aqueles com que estamos falando, a escutá-los e a compreender suas mensagens. 

quarta-feira, 16 de março de 2016

SAIR DO CENTRO - O VALOR DAS PALAVRAS - JORGE WAXEMBERG

Sair do centro
(para ler o livro na íntegra acessar: www.cafh.or  - idioma português - publicações).


Quando deixamos de ser o centro, as nossas decisões, julgamentos, desejos e ações deixam de estar tingidos pela intenção subjacente de defender- nos, de justificar-nos, de obter algo que apoie a visão que temos do mundo e da vida.



No contexto deste trabalho, sair do centro significa deixar de sentir-nos o centro de tudo o que ocorre. Para alcançar uma visão mais ampla sobre nós mesmos e sobre o que acontece, propomos um exercício que abra uma saída desse centro imaginário. Por exemplo, o de não falarmos sobre nós mesmos.
Quando se nos propõe este exercício, talvez nos perguntemos: "Se não falo de mim, do que vou falar?" Estamos acostumados a centrar as conversações sobre o que fazemos ou fizemos, sobre o que nos acontece ou nos aconteceu, sobre o que queremos, o que nos agrada, o que nos faz sofrer. Até fazemos reuniões só para dizer e escutar o que cada um quer dizer sobre si mesmo e sobre a sua vida, e sentirmos que essa participação nos faz bem.
Certamente esse tipo de conversação não só é válida, mas também recomendável quando estamos muito estressados ou um pouco confusos por não sabermos com clareza como reagir ou como nos comportar em certas situações. Mas temos que admitir que restringir a conversação a falar apenas de si mesmo, especialmente se o fizermos de forma habitual e repetitiva, ou a cada vez que nos reunirmos, voltamos aos mesmos problemas, às mesmas queixas, aos mesmos alardes ou às mesmas críticas, então essa forma de falar não faz bem nem a nós nem aos que nos escutam.
E se nos entretemos em dar-nos más noticias sem fazer nada para remediá-las, só semeamos tristeza e mal-estar.
Além disso, insistir em falar de si mesmos ou do que afeta a si mesmo mostraria quanta importância nos damos e também quão restrito é o âmbito de nossos interesses, de nossas preocupações e, inclusive, de nossas aspirações.
Mas a verdade é que somos o centro da maioria de nossas conversações. Até mesmo quando nos queixamos dos outros ou os criticamos, ou não escutamos, estamos expressando algo sobre nós que acreditamos que é muito importante manifestar.
O exercício que propomos se baseia em cortar o hábito de voltar continuamente a atenção sobre nós mesmos para referir-nos ao que sentimos, pensamos, fazemos ou nos aconteceu.
Depois o exercício se estende a outro hábito mais profundo que poderíamos ter: o de colocar em nós o ponto de partida de todas as considerações, avaliações, interesses e decisões, levando em conta apenas nossa satisfação ou nosso benefício particular –e, às vezes, o de nossos parentes–. Em síntese, em transformar-nos no centro da vida e do mundo, apesar de que nos seja óbvio que não é assim.
Quando nos habituamos a praticar este aspecto do exercício, muda a nossa maneira de ser e de expressarmos e, o que é importante, desde o ponto de vista de nosso desenvolvimento, adquirimos uma maior facilidade para expandir nossas ideias e sentimentos. Nossa forma de pensar, de considerar os eventos e os seres passa a abranger âmbitos cada vez maiores.
Esta mudança nos impulsiona a expandir também a área de nossos interesses; estes já não se limitam a nossos interesses particulares e pouco a pouco incluem áreas mais gerais e universais, até que nossos problemas deixam de ter tanta importância para nós e adquirem relevância os problemas dos outros e também os da sociedade.
Isto não implica que desconheçamos nossos problemas e que deixemos de trabalhar sobre os mesmos, mas que eles deixam de constituir o centro a partir do qual avaliamos tudo o que é e o que ocorre.
O exercício de não falar de nós mesmos pode ser praticado da seguinte maneira:
  • Quando estamos com uma pessoa ou em uma reunião, não falar de nós mesmos –do que nos acontece, do que sentimos, fazemos ou desejamos– durante um tempo determinado, de acordo com a duração da reunião
  • Dedicar mais tempo para escutar que para falar
  • Prestar atenção ao que os outros dizem e falar dos
    temas que lhes interessam
  • Deter o hábito –caso o tenhamos– de estar dependentes do que nos acontece
  • Deter o hábito –caso o tenhamos– de defender de forma obstinada e caprichosa os nossos pontos de vista
    Ampliar o âmbito de nossos interesses:
    • Antes de propor ou fazer algo, refletir sobre a forma como essa proposta ou essa ação pode afetar a outros
    • Prestar atenção ao que ocorre fora de nós e envolver- nos, seja de forma direta –quando se trata de algo que nos concerne em forma particular– seja participando interiormente dos sofrimentos que hoje

afligem a tantos seres que nem sempre estão presentes em nossa mente
É claro que não temos de cair na modalidade de continuar falando de si mesmos enquanto mudamos apenas a forma de fazê-lo.
Às vezes, a pessoa acredita que não fala de si mesmo, nem pensa em si mesmo pelo fato de haver iniciado um plano de ação que envolve um grupo de pessoas ou um setor humano, ou porque tem por finalidade solucionar problemas sociais ou mundiais.
Certamente é bom preocupar-se e trabalhar para solucionar problemas gerais, mas o fato de incorporar-se a um grupo que faça isto ou o fato de portar uma bandeira que proclame uma obra beneficente não implica que a pessoa tenha deixado de se sentir o centro do mundo.
Outras vezes, a pessoa acredita que não fala de si mesmo quando fala de outras pessoas, não para aprender sobre suas qualidades, experiências e realizações, mas para fazer julgamentos sobre essas pessoas, suas condutas e suas decisões. Não nos damos conta de que, dessa maneira, nos assentamos com muita firmeza no centro a partir do qual julgamos a vida e o mundo. Tampouco nos damos conta de que ao criticar os outros pelas costas mostramos aspectos nossos que desejaríamos não ter ou, pelo menos, que não fossem tão evidentes.
Não falar de si mesmo leva espontaneamente a não pensar continuamente em si mesmo e a deixar de ver tudo desde um ponto de vista tão estreito, particular e limitado. Como consequência, nossos movimentos interiores, nossos objetivos, desejos, relações, avaliações perdem grande parte da paixão com que os animávamos. Chamamos aqui de paixão a força com que carregamos o que sentimos, dizemos, fazemos e pensamos, e que gera em nós desejos de possuir ou alcançar algo em particular, exclusivamente nosso, sejam bens, privilégios, notoriedade ou triunfos.
Quando deixamos de ser o centro, as nossas decisões, julgamentos, desejos e ações deixam de estar tingidos pela intenção subjacente de defender-nos, de justificar-nos, de obter algo que apoie a visão que temos do mundo e da vida.
Os demais exercícios contidos neste trabalho são de certa maneira uma preparação para este exercício, já que cada um deles se centra em uma das tantas formas em que falamos de nós mesmos.
Este exercício, como os anteriores, estimula a expansão de nosso estado de consciência. Embora, talvez, no começo não percebamos, essa expansão é real pela forma como se expressa: expandem-se o nosso interesse, o nosso amor e os limites que colocamos em nossa vida. Expandem-se também as nossas possibilidades. Realizamos não só o que queremos para nós, mas também o que os outros necessitam que façamos para o seu bem e o da sociedade.
Por outro lado, praticar este exercício nos ajuda para que, quando falarmos de nós mesmos, discirnamos por que estamos fazendo isto. Por exemplo, quando dizemos aos outros o que está acontecendo conosco, vemos com clareza se o estamos fazendo para que as nossas experiências possam ajudar aos que as escutam, ou se as narramos para despertar compaixão, ou admiração, ou por que nos sentimos tão importantes que necessitamos que prestem atenção em nós e que nos tenham em alta conta.
Quando conseguimos este discernimento, o exercício fica para trás, uma vez que nos mantemos conscientes de por que e para que falamos, e orientamos nossas palavras de maneira tal que redundem em um bem para os que nos escutam. 

segunda-feira, 14 de março de 2016

EXPLICAÇÃO NECESSÁRIA - O VALOR DAS PALAVRAS - JORGE WAXEMBERG

Explicação Necessária

(para ler o livro na íntegra acessar o site: www.cafh.org - idioma português - publicações)

Quando conseguimos vulnerabilidade, em vez de nos ofender ou nos irritar quando alguém nos diz algo que não condiz com a opinião que temos sobre nós mesmos, abrimo-nos para aprender sobre a impressão que causamos nos outros com nossas atitudes e ações. Essa impressão define o que somos para os outros no meio em que vivemos.


As explicações são uma das formas mais comuns que utilizamos para defender o que pensamos, sentimos e fazemos. Embora nem sempre sejam necessárias, sentimos que temos que dar explicações quando um comentário ou uma situação coloca em destaque algum erro ou equívoco nosso, ou que temos que pedi-las quando cremos perceber as faltas de outros.
É óbvio que temos que dar explicações quando é justo que nos peçam ou quando temos a obrigação de dá-las. Por exemplo, porque o nosso trabalho o exige ou porque fizemos modificações em tarefas que afetam as dos outros. Mas quando não é assim e damos explicações, convém que reflitamos por que as damos –e também por que as pedimos, quando assim o fazemos–.
Quando alguém faz algo diferente do que esperávamos que fizesse, costumamos reagir com raiva e, em vez de expressar com clareza o nosso desgosto, pedimos-lhe uma explicação que não queremos receber. Por exemplo, dizemos “Por que fez isso?”. Quando nos respondem com razões, nós as rechaçamos e começamos a discutir. Melhor teria sido expressar-lhe de forma simples o que sentimos pelo que fez.
Da mesma forma, quando pedimos explicações a alguém porque algo nos desagrada em seu comportamento –em vez de dizer-lhe o que sentimos ou pensamos sobre seu comportamento– é comum que essa pessoa se irrite mais do que se lhe assinalássemos algum erro ou um esquecimento, e comece a dar justificações para não assumir sua forma de agir. Por um lado, expressamos uma reprovação; por outro, sentimos que não somos escutados porque nos respondem com desculpas. Este sistema de reações em nossas relações é triste e resulta em tensão e mal entendidos.
Até pode ocorrer que, quando alguém nos chama a atenção sobre tarefas que efetuamos, também demos explicações para dissimular nossas falhas e fugir assim de julgamentos que não nos agrada escutar.
Estes tipos de explicações são justificações, uma das formas mais comuns de autodefesa. Essas justificações se opõem a nossa lucidez porque com elas escondemos de nós mesmos nossas faltas e debilidades. Também se opõem a nossa capacidade para trabalhar sobre aspectos nossos que poderíamos –ou teríamos– que melhorar. Porém o mais importante é que, se quem nos chama a atenção está certo quando julga como equivocada uma decisão ou um comportamento nosso, o que fazemos com nossas justificações é negar-nos a aceitar que o que nos disseram estava certo.
Ou seja, negamo-nos a refletir e a revisar nosso comportamento ou nossas decisões. Este é um dos casos em que geramos a exclamação “ele não escuta” por parte de quem está nos falando.
Além disso, se dermos lugar para que nos deem justificativas, ou se exigimos de alguém explicações quando estas não são necessárias, estimulamos suas defesas impulsivas e enfraquecemos sua possibilidade de compreender sua maneira de agir.
Por esta razão, o exercício de não dar explicações implica também o de não pedi-las quando estas não são necessárias.
Por outro lado, as explicações são um dos meios através do qual voltamos a gostar de nossos acertos e a afastarmos de nossa mente os nossos erros.
É comum que quando fazemos algo bom tenhamos o desejo de comentar e explicar o que fizemos. Cada vez que explicamos voltamos a gostar de nosso êxito.
Também é comum que quando, por preguiça ou por falta de hábitos adequados, não podemos cumprir algo que temos que fazer, sintamos a necessidade de explicar por que não podemos fazê-lo. Cada vez que explicamos nos convencemos de que causas alheias nos impediram de fazer o que tínhamos que fazer.
Esses comentários deterioram a conversação e também a nossa relação com os demais. É pouco provável que os que nos escutam sintam prazer pelas nossas intenções de lhes inspirar admiração ou lástima por nós.
O exercício sobre as explicações necessárias consiste em:
  • Não fazer comentários sobre nossas ações, nem para avaliá-las nem para validá-las
  • Não dar justificativas quando alguém expressa sua crítica em relação a algo que fizemos
  • Deter em nossa mente os movimentos de desgosto que não manifestamos nesse momento, caso os tenhamos.
  • Expressar com clareza que reconhecemos os erros ou enganos que cometemos.

A primeira consequência deste exercício é que os fatos fiquem em nossa memória tal como são; isto nos ajuda a não repetir erros.
A segunda consequência deste exercício é que ganhamos um grande espaço mental porque não o preenchemos com uma contínua argumentação para nos justificar ou para condenar a conduta de outros.
Além disso, ganhamos tempo concreto porque não o gastamos dando longas explicações que não mudam o que já aconteceu.
A terceira consequência deste exercício é que nos acostumamos a ver e a entender as coisas como são e não como gostaríamos que fossem.
O ideal seria não sentir a necessidade de dar explicações desnecessárias; para conseguir isso podemos começar aceitando as nossas limitações e as dos demais, e habituando-nos a não gastar inutilmente nosso tempo nem o dos outros com explicações que não são necessárias.
Outro objetivo deste exercício é fazer-nos vulneráveis para poder aprender.
Ser vulnerável é reconhecer nossa ignorância não só em relação a aspectos ainda desconhecidos da realidade, mas também em relação a quem somos para os outros, especialmente para aqueles com quem convivemos. Quando alcançamos vulnerabilidade, em vez de ofender- nos ou irritar-nos quando alguém nos diz algo que não condiz com a opinião que temos sobre nós mesmos, abrimo-nos para aprender sobre a impressão que causamos em outros com as nossas atitudes e ações. Essa impressão define o que somos para os outros no meio em que vivemos.

Para quem lê um livro, o que este diz não é que está escrito nele, mas o que se entende quando se o lê. Talvez o que se entende não seja exatamente o que o autor quis dizer, mas esse entendimento é a base sobre a qual o leitor julga o livro. Da mesma maneira, se queremos nos conhecer, não é o que pensamos sobre nós o que tem que nos importar, mas a maneira como os demais percebem e interpretam as nossas palavras e atos. Os que nos rodeiam são o espelho onde temos que nos observar para aprender sobre nós mesmos. 

sexta-feira, 11 de março de 2016

QUEIXA FRUTÍFERA - O VALOR DAS PALAVRAS - JORGE WAXEMBERG

Queixa frutífera

Deter a queixa nos ensina a contemplar os fatos tal como são em vez de rechaçá-los quando nos desgostam. Isto nos permite discernir o que podemos fazer em relação ao que nos faz sofrer e projetar um plano de ação para solucioná-lo.
Quando nos queixamos, expressamos uma dor ou um sofrimento, ou então um ressentimento ou desconformidade com alguém ou com algo. De acordo com a razão da queixa e com o resultado que obtivermos ao expressá-la, podemos dividir as queixas em:
Reclamação
  • Queixa justificada
  • Queixa infrutífera
    A reclamação é um direito que temos para que, por exemplo, nos seja fornecido um serviço que contratamos, mas que não recebemos. Quando nossa reclamação é atendida e recebemos esse serviço, dizemos que foi frutífera.
    Nossa queixa é justificada em várias situações. Algumas delas são, por exemplo:
    • Quando expressa nosso pesar pelo falecimento de um ser querido ou pelo rompimento de uma relação importante para nós.
    • Quando nos queixamos ao médico pelas dores que sofremos, em busca de uma cura. Esta queixa é frutífera porque proporciona ao profissional os dados de que necessita para aconselhar um tratamento
    • Quando expressa nosso sofrimento porque alguém nos inflige uma dor de forma arbitrária. Nestes casos, embora nossa queixa possa não ser frutífera, ao menos nossa intenção é que o seja, já que reclamamos para que quem esteja nos fazendo sofrer deixe de fazê-lo.
Mas nem sempre nos queixamos de forma frutífera. Se nossa dor se prolonga até converter-se em patológica já não é frutífera, mas um transtorno que pode ser tratado. Se nos mantivermos dependentes do que nos dói ou do que poderia nos doer, as nossas queixas ao médico nem sempre serão frutíferas. Se reagirmos de forma desmedida e nos enraivecermos quando alguém, de forma inadvertida, nos produzir alguma dor, nossa queixa raivosa não é necessária. Quem nos feriu sem querer não necessita de nossa recriminação para lamentá-lo.
Não nos queixamos somente por causa de dores; quando algo não acontece como gostaríamos ou como havíamos esperado, ficamos chateados e expressamos esta reação com queixas sem analisar o que conseguimos ou produzimos com nossos protestos. Nestes casos, o mais sensato seria investigar o que podemos fazer para remediar o que nos incomoda e fazê-lo.
Inclusive fazemos queixas que de antemão sabemos que serão infrutíferas.
Quando continuamos a nos queixar apesar de sabermos que não conseguiremos nada ao fazê-lo, poderíamos chamar de lamentos auto-compassivos as nossas queixas. Esses lamentos, além de inúteis, são incômodos e prejudiciais.
São incômodos porque é difícil que alguém queira ficar perto de nós se o que escuta de nós são ladainhas de lamentos. São prejudiciais porque criam tensão no ambiente e acrescentam ainda mais mal estar a uma situação que já está nos produzindo mal estar. Além disso, o hábito de lamentarmos gera em nós um estado de ânimo de mau humor, amargura a nossa vida e a de quem convive conosco.
A queixa infrutífera produz em nós um profundo desgosto. Talvez imaginemos que ao queixar-nos estaremos fazendo algo para mudar uma situação que nos incomoda, apesar de sabermos muito bem que esses lamentos não produzirão nenhuma mudança.
Por exemplo, nos queixamos porque não chega alguém que havia dito que viria nos ver ou porque chegou uma pessoa que não desejamos encontrar. Ou nos queixamos de alguém que não está presente, ou que talvez já nem esteja vivo, e expressamos a nossa queixa a quem quiser nos escutar –e que não fará ou não poderá fazer nada para aliviar o nosso sofrimento–. Podemos até mesmo nos queixar do clima, da passagem do tempo e de situações da vida que ninguém consegue evitar, pelo menos até agora. Enfim, nós nos queixamos de situações que não mudaremos com lamentações.
Embora as queixas infrutíferas nos permitam descarregar a tensão produzida pelos desgostos, o certo é que com este tipo de queixas tapamos a realidade; não queremos aceitar o que é óbvio da vida, de nossas relações e de nossa situação no mundo. E, enquanto não aceitamos a realidade, vivemos às cegas, tateando e com temor pelo que pode acontecer.
A auto-compaixão implícita na maioria de nossas queixas atenta contra nossa capacidade de reagir de forma positiva ante as contrariedades próprias da vida e as dificuldades que encontramos para realizar nossos objetivos.
Imaginemos que um atleta, enquanto corre na maratona, fica se queixando das dores que sente enquanto corre. É improvável que essa atitude o ajude a alcançar a meta. Da mesma maneira, quando nos queixamos de forma infrutífera, geramos sentimentos e atitudes que se opõem à possibilidade de realizar o que desejamos, de desfrutar a vida e as nossas realizações.
Deter a queixa nos ensina a contemplar os fatos como são em vez de rechaçá-los quando nos desgostam. Isto nos permite discernir o que podemos fazer em relação ao que nos faz sofrer e traçar um plano de ação para solucioná-lo.
Em consequência, o exercício sobre a queixa é o seguinte:
  • Diante de um contratempo, deter o impulso de queixar-nos
  • Discernir o que fazer para solucionar ou aliviar o que nos aflige
  • Se pudermos fazer algo, fazê-lo
  • Uma vez feito o que podíamos fazer, não nos queixar
    daquilo que nos contrariou
  • Se não podemos fazer nada, não verbalizar queixas
  • Não nos queixar mentalmente quando nos lembrarmos do ocorrido
  • Deixar para trás o incidente; não voltar mentalmente a ele
    No entanto, ainda que entendamos a futilidade de algumas de nossas queixas e pratiquemos este exercício, se tivermos esse hábito muito arraigado em nós, pode acontecer que continuemos a nos queixar. Se assim for, tratemos de nos dar conta de que embora possamos nos sentir melhor quando nos queixamos, como se estivéssemos nos livrando de algo que nos faz sofrer, ao queixar-nos atendemos apenas ao que nos dói no momento, sem ver tudo o que poderia nos fazer felizes se o tivéssemos em conta.

Vale a pena, então, que, quando começamos a nos queixar por causa de alguma coisa, tratemos de ampliar o contexto e perceber tudo de bom que temos e que nos acontece, e também todas as coisas dolorosas que poderiam nos acontecer e que não estão nos acontecendo. Ou, pelo menos, pensemos em algo diferente do que motiva a nossa queixa, para deter a mortificação que estamos produzindo em nós e também naqueles que nos escutam.
Por mais desesperada que nos pareça uma situação, se conseguirmos não dramatizá-la e refletir com calma sobre ela, o mais provável é que encontremos formas de superA- la ou, pelo menos, de aliviá-la. Desta maneira, poderemos nos relacionar de forma mais clara com o que ocorre, compreender melhor o que se passa ao nosso redor e o que nos acontece em nossa interação com o devenir. 

Para baixar o livro na íntegra acesse:
www.cafh.org
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quinta-feira, 10 de março de 2016

PONDERAR O QUE DIZEMOS - O VALOR DAS PALAVRAS - JORGE WAXEMBERG



Ponderar o que dizemos


                                            Escutar
                          Ponderar o que dizemos é prestar atenção ao que implicam 
              tanto nossas palavras quanto nossa intenção e nossa atitude ao dizê-las.


Você não escuta!” Quantas vezes dizemos –e nos dizem– estas palavras? O certo é que com muita frequência não nos sentimos ouvidos quando falamos. Nosso interlocutor pretende prestar atenção ao que dizemos, mas é evidente que nossas palavras não causam nenhum efeito nele. Mantém seus juízos, apreciações e explicações como se o que dissemos não tivesse valor nem fosse digno de alguma consideração.
O hábito de não escutar é uma forma de nos defendermos do que nos desgosta ou nos fere. Por exemplo, se nos dizem algo que é verdade, mas não queremos admitir isto abertamente, uma forma de nos defendermos é continuar a conversa como se não tivéssemos ouvido o que nos disseram.
Outra forma de não escutar é dar explicações quando nos dizem algo que não queremos ouvir. Por exemplo, se alguém nos diz que tivemos uma conduta torpe, costumamos responder, para nos conciliarmos, dizendo que não foi nossa intenção, que fizemos o que achávamos que seria melhor etc. É evidente que, além de não escutar, não percebemos o que essa pessoa sentiu devido a nosso comportamento. Teria sido muito mais simples e útil que tivéssemos reconhecido com sinceridade seus sentimentos e nos desculpássemos com poucas palavras. Ao não fazermos assim, manteríamos vivo um desentendimento –ou uma disputa– que deterioraria progressivamente nossa relação com ela.
Em algumas ocasiões não escutamos porque o que o que é dito nos aborrece ou não nos interessa. Fazemos associações, pensamos em outras coisas ou em decidir o que faremos quando o nosso interlocutor terminar de falar. Não nos damos conta de que, para quem nos fala, tem importância o que diz, mesmo que seja algo que nós já sabemos. Por exemplo, quando alguém nos conta um filme a que assistimos juntos, talvez o faça para nos mostrar aspectos que pensa que não prestamos atenção. Em vez de nos distrairmos durante a sua narração, poderíamos fazer algum comentário que oriente para uma conversação interessante sobre um aspecto desse filme ou sobre um tema derivado dele.
Quando alguém nos diz algo que, no momento, não nos interessa é bom perceber que, através de suas palavras, essa pessoa está nos estendendo a sua mão para que a apertemos. Está nos falando de algo que lhe interessa, para que a compreendamos e a acompanhemos. Se não apertamos essa mão através de nosso interesse e atenção ao que nos diz, quebramos a ponte através da qual poderíamos ter estabelecido ou consolidado a nossa relação. Fugirmos dessa conversação poderia implicar falta de empatia e indiferença em relação a quem não comunga com nossas preferências.
Não só o escape mental é uma forma de não escutar o que alguém diz; manter-se sem falar e às vezes sem olhar para quem está falando é uma maneira agressiva de se retirar de uma conversação ou de se afastar do grupo.
Pode ocorrer que, embora uma pessoa pense que não a escutamos, não nos diga isso porque já o disse outras vezes –com essas palavras ou de outra forma– sem que tenhamos mostrado que a escutamos. Se prestarmos atenção, certamente notaremos que algo enfraqueceu a relação que temos com essa pessoa.
Seria bom, então, que lhe perguntássemos com simplicidade o que aconteceu e, quando ela nos responder, não justifiquemos com explicações o desentendimento que geramos.
Em poucas palavras: ouvimos mas nem sempre escutamos.
Da mesma forma, vemos e nem sempre falamos como se tivéssemos visto.
Permanecer em silêncio perante um fato reprovável, como se fossemos indiferentes ao que acontece, é uma maneira implícita de expressar que estamos de acordo com o que aconteceu, e assim também o interpretam aqueles que percebem esse silêncio.
Mas nem sempre é oportuno expressar o que sentimos ou pensamos a respeito do que está ocorrendo. Convém nos mantermos atentos para medir com prudência nossos comentários.
De acordo com a situação, criticar e condenar abertamente tudo o que nos parece reprovável pode não ser a melhor maneira de expressar a nossa opinião, especialmente quando ninguém pede nem espera que falemos porque não é o momento ou o lugar de fazê-lo, ou não somos a pessoa indicada para julgar nesse momento essas situações.
Para saber quando falar e qual é a melhor coisa a ser dita, convém aprender a escutar.
Escutar não se limita a prestar atenção somente ao que os outros dizem, mas também ao que nos dizem a situação, o momento, o ambiente e a atitude das pessoas com quem estamos.
Escutar é deixar entrar em nós o que vemos e ouvimos, e assim compreender que a nossa melhor resposta é a que evidencia que escutamos. Se não fizermos assim, poderemos fazer uma crítica inoportuna que agravaria ainda mais uma circunstância que já é difícil; ou fazer críticas sem fundamentos que não agregam luz aos juízos de outros e que, além disso, mostram nossa falta de critério; ou continuar com uma argumentação que expresse a nossa rejeição ao que nos dizem.
Escutar é também perceber se os que estão conosco poderiam receber com agrado o que nos ocorresse dizer naquele momento. Às vezes precipitamo-nos em contar, durante um longo tempo, alguma anedota que parece interessante para nós, mas que não o é para os demais ou que não seja agora o melhor momento para contá-la.
Escutar é prestar atenção quando alguém introduz um tema que parece interessar aos presentes. O que essa pessoa diz ao iniciar o tema pode despertar em nós associações que nos movam a interrompê-la para contar algo intranscendente que nos aconteceu e, a partir dali, continuarmos com associações em uma conversa que tornaria impossível voltar ao tema que alguém iniciou e que tinha importância para os demais.
Escutar é, além disso, escutar-nos a nós mesmos quando falamos; perceber se somos rígidos em nossos juízos, condenatorios em nossas opiniões ou se nos perdemos em aspectos menos importantes do tema de uma maneira tal que torna difícil alguém –ou nós mesmos nos lembrarmos– do que dissemos. Se isto ocorresse, mostraria que também não soubemos escutar o eloquente silêncio daqueles que obrigamos a acompanhar nossas divagações.
Escutar a nós mesmos é particularmente difícil quando temos o hábito de falar a todo o momento, quer sejamos convidados ou não a fazê-lo. Não nos damos tempo nem para pensar no que vamos dizer nem para refletir sobre o que dissemos, e é improvável que nossa conversação possa ser interessante ou instrutiva para alguém.
Em um contexto mais amplo escutar é, pelo menos, tratar de compreender a mensagem que nos é dada pelas experiências que vivemos e pelas circunstâncias do meio em que agimos, como também as que a humanidade vive no dia a dia. Receber notícias sem responder a elas, em muitos casos implica bloquear toda novidade que possa nos perturbar, ou ser indiferente e insensível ao que acontece mesmo que não nos afete diretamente. Nestes casos, responder a notícias vai além de dizer palavras; é agir de forma solidária e participativa, de acordo com as circunstâncias. E quando não pudermos colaborar ou ajudar de forma direta, seja porque não estamos capacitados ou porque se trata de fatos que não nos dizem respeito, particularmente, tratemos de incluir em nossa consciência todas as vicissitudes da vida humana, até que nos seja espontâneo sentir que o que acontece em qualquer lugar do mundo também acontece conosco.
Poderíamos chamar de fechada a atitude de não escutar, porque deliberadamente obscurecemos nosso entendimento ao negar-nos a reconhecer o que significam as palavras que nos dizem.
O exercício de escutar consiste em:
Deter as reações que nos induzem a rechaçar o que ouvimos ou a interromper a quem esteja falando
  • Refletir sobre o que nos foi dito
  • Validar o que escutamos
  • Responder e agir em consequência com essa validação
    Espontaneamente ouvimos e espontaneamente falamos. Mas escutar não é espontâneo em nós; é uma arte que é bom aprender. O exercício que propusemos e os descritos mais adiante são meios que nos ajudam a alcançar essa arte. 
Para baixar o livro na íntegra: www.cafh.org - idioma português - publicações.

quarta-feira, 9 de março de 2016

DEFESAS VERBAIS - O VALOR DAS PALAVRAS - JORGE WAXEMBERG

Defesas verbais
  (quem tiver interesse em baixar o arquivo completo do livro entrar em:
    www.cafh.org  -  idioma português - publicações)
São muitas as maneiras como nos defendemos, não só do que atenta contra a nossa vida, a nossa saúde e o nosso bem estar, mas também do que percebemos como ataques ao que sentimos que somos, pensamos e fazemos. Neste trabalho nos limitamos a considerar só algumas das defesas verbais que costumamos usar para nos proteger em situações que nos geram tensão ou ameaçam a nossa autoimagem.
Estimamos que seja importante, especialmente desde o ponto de vista de nosso desenvolvimento, trazer à luz perante nós mesmos as nossas defesas verbais. Embora, por um lado, essas defesas nos ajudem a enfrentar as circunstâncias da vida, por outro, travam o nosso adiantamento e também a possibilidade de conhecer-nos melhor.
Estamos tão identificados com as nossas defesas verbais que, apesar de sermos conscientes delas, não percebemos que elas nos cegam a respeito de como somos, porque somos assim, e também sobre o que produzimos nos outros e no meio ao usá-las. Como pensamos que a forma como falamos é própria de nossa maneira de ser, sentimos que somos livres para falar do modo como nos surgirem as palavras. Cremos que somos espontâneos, sem perceber que obedecemos a impulsos que não só disparam por si mesmos nossas palavras, mas que também estabelecem a qualidade de todo o sistema de nossas relações. A linguagem, em resumo, se nos mostra como um meio, sempre a nosso alcance, para trabalhar em nosso desenvolvimento e na relação com quem convivemos.
Quando uma situação expõe nossos problemas ou quando toca pontos nevrálgicos íntimos nossos reagimos de muitas formas, desde a agressão física até a mudez, desde a zombaria até a enunciação de uma teoria sobre a realidade; mas sempre a nossa reação expressa uma maneira de defender-nos do que coloca em destaque algo que não aceitamos nos outros ou em nós, ou situações que não podemos resolver ou que não queremos conhecer.
Por outro lado, apesar da precariedade de nossas certezas, sentimos a necessidade de estar totalmente seguros sobre o que pensamos e acreditamos não só sobre a vida e o mundo, mas, especialmente, sobre o que pensamos a respeito de nós mesmos. Qualquer coisa que ataque ou ponha em dúvida essas certezas ativa em nós, de forma automática, defesas que geram emoções e reações que, geralmente, expressamos em palavras.
Boa parte de nossas conversas servem mais para aliviar as nossas tensões e reforçar a imagem que temos de nós mesmos do que para estabelecer uma comunicação proveitosa com os nossos interlocutores.
Dar escape vocal à tensão nervosa é uma maneira de defender-nos de nós mesmos ou dos demais. Se algo nos incomoda muito, usamos a linguagem para canalizar a força de uma reação que não podemos dominar. Como temos dificuldade em reconhecer nossas fraquezas, acostumamo-nos a apontar fora de nós, com palavras, as causas de nossas explosões emocionais.
Na relação interpessoal, muitas de nossas conversações também são válvulas de escape ao invés de meios de participação real. Por exemplo, quando sofremos uma situação difícil procuramos alguém para falar sobre ela. Ao contar para outra pessoa o que se passa conosco nos sentimos aliviados, sem reparar ou nos importar se essa pessoa tem tempo para nos escutar, nem se tem uma
disposição propícia e suficiente fortaleza para receber nossa descarga. Tampouco nos ocorre pensar o quanto turvaremos o seu dia –ou a sua vida– com o que vamos lhe dizer.
As defesas verbais são também formas de auto-justificação. Expressar a nossa raiva quando nos criticam é uma forma de afirmar-nos em relação ao que fazemos e pensamos. Ao criticamos os outros, sentimo-nos superiores a eles, justificamos o que somos e consolidamos a nossa crença de estarmos certos.
No contexto do uso de palavras, podemos distinguir dois tipos de defesa automática.
Ao primeiro, chamamos Defesas Limitantes, porque turvam a nossa percepção e o nosso entendimento. Por exemplo, quando nos negamos a escutar, ou nos justificamos ou nos queixamos. Descrevemos algumas destas defesas na seção Ponderar o que dizemos.
Ao segundo tipo chamamos Defesas Agressivas, porque as usamos como armas de ataque. Por exemplo, palavras cortantes, juízos condenatorios. Descrevemos algumas destas defesas na seção Discernir o que dizemos.
De que maneira nos convém proceder em relação a nossas defesas verbais para que não dificultem o nosso desenvolvimento nem deteriorem as nossas relações? Uma forma simples de trabalhar sobre elas é colocá-las em evidência. Ao vê-las tal como são, tornam-se óbvios a sua futilidade e o baixo nível de consciência que elas implicam. Os exercícios de detenção que descrevemos neste trabalho têm esse propósito.
Os exercícios de detenção também podem ser muito valiosos para aprendermos sobre nós mesmos. Se os fizermos não só quando descobrirmos nossas defesas verbais, mas também em outros momentos de nossa vida, poderemos abrir campos
na consciência que temos de nós mesmos e de nossa circunstância.
Quando detemos o que pensamos, sentimos ou fazemos ocorre em nós algo semelhante ao que acontece quando um veículo com carga se detém subitamente. O que está solto é jogado para frente, o que está preso tenciona os meios que o seguram.
Da mesma maneira, quando nos detemos interiormente, o que está “solto” em nós se projeta em nossa mente como se esta fosse uma tela: pensamentos e sentimentos habituais, associações, recordações, rancores; o que está “assegurado” –ideias feitas, preconceitos– possivelmente fica mais ajustado. Com a prática, e talvez de maneira espontânea, começamos a compreender por que pensamos como pensamos e agimos como o fazemos.
O hábito de observar imparcialmente o que está em nós nos ajuda a compreender por que está em nós. Isto nos impulsiona a ampliar a nossa visão das coisas, a aprofundar a nossa noção de ser e a harmonizar nossas relações.
Para praticar os exercícios descritos neste texto convém fazermos um plano: quais exercícios fazer, durante quanto tempo e com que frequência. Ou ainda, em que oportunidade fazê-los, de acordo com as características de cada exercício.
Além disso, é bom complementarmos esses exercícios de detenção com exercícios de reflexão.
Um exercício de reflexão consiste em tomar distância de nossas reações. Como estas são espontâneas e habituais, normalmente as identificamos com a nossa forma de ser em vez de vê-las como aspectos de conduta que podemos analisar se refletirmos sobre eles.
Por exemplo, em um momento no qual podemos estar em silêncio e tranquilos, repassamos as diversas formas como

reagimos diante dos acontecimentos do dia. Não qualificamos essas reações; só as observamos e tratamos de descobrir que motivações às vezes nos impulsionam a reagir de maneira que fere as pessoas que nos importam –reações que também nos ferem, talvez sem que percebamos o dano que nos causamos–.
Outro exemplo consiste em refletir sobre o que experimentamos ao efetuar os exercícios. Da mesma forma que no exercício anterior, escolhemos um momento de silêncio e tranquilidade para repassar o que aconteceu durante nossos exercícios. Observamos as reações interiores que experimentamos e também a forma como reagiram os que nos rodeiam, quando os praticamos. Por exemplo, refletimos sobre o que acontece em nós quando não dizemos algo que temos o impulso de dizer. Também observamos o que acontece com os outros quando lhes oferecemos o espaço criado por nossa moderação ao falar. E tiramos conclusões.
Nos capítulos seguintes se encontram alguns exercícios que podem nos evidenciar as nossas defesas verbais; na ultima parte deste trabalho incluímos algumas pautas que podem nos ajudar a organizar os pensamentos, sintetizar os conceitos, amenizar a conversação e, especialmente, desenvolver empatia e participação com os demais.
Todos os exercícios estão interligados. Cada um deles é um aspecto de um único exercício que poderíamos resumir em uma atitude de liberdade interior e de respeito para com os que nos rodeiam.