terça-feira, 8 de março de 2016

O VALOR DAS PALAVRAS - JORGE WAXEMBERG - INTRODUÇÃO

Introdução

À primeira vista, a série de exercícios descritos neste trabalho pode parecer uma proposta utópica. Frente à violência generalizada e às tensões internacionais que ameaçam a precária paz que temos, defender o uso de nossas palavras aparece como uma digressão tão distante dos problemas que sofremos que não valeria a pena considerá-la.
No entanto, considero que o enfoque deste trabalho é realista; aponta-nos para reconsiderar o valor que damos ao que dizemos e para compreender o efeito que produzimos com nossa maneira de falar.
Nem sempre temos presente que a linguagem é a base da comunicação entre nós e que a maneira como a usamos não só estabelece o caráter de nossas relações, mas também a qualidade do que sentimos e geramos ao viver uns com os outros.
Por isto, no meu modo de entender, o manejo de nossas palavras tem grande importância tanto em nosso desenvolvimento individual quanto no da sociedade. Com palavras formamos ou destruímos vínculos; com palavras aprendemos e ensinamos; com palavras criamos em grande parte o mundo em que vivemos e a forma de viver nele.
Se considerarmos o processo que nos conduz a problemas de relação interpessoal, de casal e também de conflito entre setores e coletividade, frequentemente encontraremos que tudo começa com as palavras: o que dizemos, como o dizemos, por que o dizemos e como os outros interpretam o que dizemos; o que declaramos e o que proclamamos e o que não dizemos sobre o que pensamos e o que faremos.
Se dissermos palavras imprudentes ou inoportunas, não poderemos apagá-las nem evitar as suas consequências; tampouco um silêncio carregado com paixão pode ser esquecido e o seu efeito perdura, às vezes, por toda a vida.
Os que ansiamos estimular o nosso desenvolvimento, buscamos expandir as nossas ideias e contribuir para o adiantamento humano, mas nem sempre prestamos atenção a como a linguagem que usamos e a forma como nos expressamos afetam a nossa relação com os demais. Por isso, vale a pena prestarmos atenção a nossas palavras.
Por outro lado, ao prestar atenção ao que dizemos ao falar e ao modo como o dizemos, descobrimos que, na linguagem, temos uma ferramenta valiosa para adquirir domínio sobre nossas emoções e, especialmente, sobre nossos estados de ânimo. Compreendemos, então, que as nossas palavras são as rédeas com as quais podemos adquirir domínio sobre o que sentimos e, através desse domínio, sobre o que fazemos.
Além disso, a forma como nos expressamos pode mostrar-nos aspectos nossos que nem sempre estamos dispostos a explorar. Por exemplo, podemos descobrir que quando dizemos o que sentimos e pensamos, e até mesmo quando narramos coisas intranscendentes, muitas vezes, falamos como se tivéssemos que nos proteger de ataques que põem em perigo o que sentimos que somos e valemos. Em outras palavras, descobrimos as nossas defesas verbais automáticas. Como estas podem influir fortemente em nosso estado de ânimo e em nossas relações, dedicamos espaço a elas neste trabalho.
Talvez ao ler este texto reconheçamos algumas de nossas defesas verbais e tendamos a nos desalentar ao imaginar que elas são defeitos que não teríamos que ter. Certamente não é assim; nossas defesas são respostas naturais que nos permitem manter um certo equilíbrio interior e, seguramente, continuaremos a tê-las mesmo que pratiquemos com assiduidade os exercícios que sugerimos. Mas quando usamos essas defesas de forma exagerada, inadequada ou inoportuna, elas se voltam contra nós porque afetam o nosso ânimo, turvam nosso discernimento e prejudicam nossas relações.
Para trabalhar sobre essas defesas, neste trabalho, propomos exercícios de detenção.
Chamamos de autoconhecimento a estes exercícios, porque quando detemos de forma deliberada nossos impulsos automáticos, fazemos aflorar, em nossa consciência, forças e motivações até então ignoradas ou rechaçadas por nós. Se aprendermos a trazê-las a luz, poderemos ver não só o que há nelas, mas também o que há por detrás delas e da noção de ser que adquirimos.
Também chamamos de convivência a estes exercícios, porque eles nos ensinam a ter em conta e a apreciar os que têm que escutar-nos, com grande benefício para a relação com aqueles com quem convivemos.
Estes exercícios também nos ajudam a deter os ímpetos que nos induzem a falar sem haver antes discernido o que vamos dizer e as consequências do que dissermos.
É que claro que os exercícios que propomos não substituem as nossas conversações, mas podem nos ajudar a conversar.
Conversar é uma arte que poucas vezes usamos ou tentamos aprender. Ou melhor, transmitimos informações: falamos para contar coisas que nos acontecem ou acontecem a outros, para narrar recordações, projetos, ou para expressar nossos problemas e dores. Ou ainda, falamos para reforçar nossas opiniões com aqueles que pensam como nós, ou para discutir sem recuar com aqueles com quem não compartilhamos nossas opiniões. Às vezes aprendemos algo com as palavras que intercambiamos; outras vezes, muito pouco.
O exercício de refletir sobre o que dizemos nos ajuda a conversar de maneira interessante, divertida e também instrutiva. Descobrimos então que a conversação é como a trama de um tecido no qual se armam e se articulam as nossas relações. Da forma como ponderarmos e discernirmos as nossas palavras, e da intenção e atitude com que as dissermos, dependerá o valor desse tecido.
Os exercícios de introspecção, bem como os de reflexão e de meditação, permitem-nos tomar distância de nosso agir, para conhecer-nos e decidir como orientar os esforços de maneira que nossa vida siga a direção que almejamos. Nossas palavras, em vez disso, nos colocam no instante da ação, o momento em que definimos nosso rumo de forma concreta. Dependendo de como as usamos podemos serenar nosso ânimo ou exacerbá-lo, conseguir discernimento ou perdê-lo. Poderíamos dizer, então, que com palavras manejamos boa parte de nosso desenvolvimento e, com ele, o de nosso futuro.
Ressaltar a importância de nossas palavras e oferecer alguma ferramenta para trabalhar sobre elas é um dos propósitos deste trabalho.

Jorge Waxemberg 
Setembro de 2012 

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